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Love Thy Neighbour II - Amor ao Próximo


















«Dá licenss. A voz empurrava o espaço dentro, criava assunto.
O que se passa, ó vizinho?, perguntou o do nono.
Se passa o problema de morar. Quando se mora, tudo fica perto. Um prédio é uma casa só, inteira de única. Todos no prédio, são noivos do mesmo espaço. Matrimoniados pelo mesmo habitar. Acredite, a vizinhança é um casamento. Veja lá: os quartos adormecem encostados uns aos outros. Os filhos dos vizinhos gritamos-lhes ralhando com os nossos. Nos cheiros provamos a comida alheia antes de ela ser servida lá, na respectiva casa. Somos os dois lados da parede, um e outro, não acha?
E porquê esta toda introdução, meu amigo?
É que é por causa disso, por causa dessa introdução, que eu estou aqui, vizinho.
Então veio a minha casa por causa de uma introdução?
Calma, eu explico: esse seu pilão, no nono andar, barulha até lá no chão. É um barulho: até doenta-nos os ouvidos. Tunc, tunc, tunc… É de mais, parece que estão a pilar a cabeça da gente. A nossa paciência, vizinho, está nos últimos grãos. Desculpa-me, mas eu tenho que lhe fazer esta autocrítica.
O homem do nono andar aceitou a queixa, razão dos incómodos sonoros. E explicou, apontando a menina: a pilosa é a minha sobrinha. Mas tem que ser, desculpe. A farinha toda moemos aqui em casa. Não pilamos por gosto...."

MIa Couto, O Pilão do Nono Andar

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Em Boa Hora

Não que eu tenha vindo para o Brasil a banhos... Não que eu não estivesse já avisado para o frio outonal do planalto Curitibano. Aqui estamos a mil metros de altitude e a temperatura é muitas vezes 10 graus abaixo da das zonas ao nível do mar, mesmo as que ficam mais a Sul. Não que eu não soubesse já dos caprichos do clima desta região. Mas custou encarar. Depois de um fim de semana a derreter, felizmente na praia de Matinhos, e de um feriado de quarta-feira passado na água gelada de uma nascente aqui em Curitiba, na quinta-feira o céu decidiu desabar sobre a cidade. E ainda não parou. Nas primeiras horas ainda com tempo quente. Mas entretanto a temperatura desceu em queda livre e estou agora mais frio do que Londres... Mas, pensando bem, veio em boa hora esta oportunidade para ficar na minha, abrigado, sossegado, sem ceder a tentações cervejísticas, cachacísticas ou musicais. "Eu não quero sair, hoje eu vou ficar queto, não adianta insistir, eu não vou no boteco..." É melhor...

Of Dames and Baronesses

Never call a baroness, dame Or the other way around You will offend both Along with a taxonomy Honed through years Of meticulous study Notice how the dame slides While the baroness slithers One withers The other wears out Pay attention to dames They are more subtle Restrained Domestic Beware of baronesses They will reproach you Tame you And then dance with the curtains When the dame is lost for words The baroness will produce the right statement When the baroness looses control The dame will bring her to her senses One is not better than the other Nor higher Nor more sophisticated Nor even more evolved They are just different And when you miss human differences You are less human yourself

Nós

Logo no início d este artigo , Miguel Sousa Tavares revela o grande equívoco que fundamenta o seu pensamento peçonhento sobre colonialidade. Num comentário lateral, MST critica o escritor Cabo-verdiano Mário Lúcio pelo seu ‘fraco uso desta extraordinária língua que lhe deixámos em herança’. Independentemente do que se ache sobre as qualidades literárias do texto ‘Como está-tua ex-celência? ‘, para MST o autor Cabo-verdiano escreve numa língua que a sua tribo herdou da ’nossa’ tribo. MST sente-se parte de um ‘nós’ especial, constituído pela história para avaliar o uso que ‘eles’ fazem do legado que ‘nós’ espalhámos pelo mundo. É como se hoje a língua pertencesse a Tavares mais do que pertence a Lúcio, tendo este de ter especial cuidado com a forma como a usa. Enebriado por imaginar-se nessa posição de autoridade, MST prossegue no seu tom habitual, demolindo tudo menos estátuas. E nem sequer repara MST na contradição em que cai poucas linhas depois. A história é nossa e não deles ...